Sempre foi um hábito, ao longo da nossa humana história,
buscarmos algo que sentíamos ser superior a nós próprios em locais deveras
distantes. Desde o primo instante em que intuímos a existência (e a presença)
de alegados “Deuses”, assim denominados, esses tais seres frutos de uma
inatingível energia, que nos acostumámos a mirá-los por entre as estrelas. Por os
julgarmos diferentes de nós, divinamente divinos (assim que tal conceito se
instalou em nossas percepções), seres dotados de extraordinários dons, julgámos
necessário colocar tais figuras – ou presenças – em altos pedestais. Assim,
surgiu a devoção, como resultado de um medo incontrolável, de uma ansiosa e
oculta busca, carência declarada ou urgência de crença e de seu conforto. Será,
por certo, complexo definir e apresentar os reais motivos, mas a eles
recorríamos em momentos de necessidade extrema, por eles sacrificámos e
massacrámos, ofertámos dádivas para obter as suas boas graças ou atrair boas fortunas.
Mas, com maior ou menor subjugação, sempre os vimos longe de nós – distantes e…
intangíveis.
Desde então, evoluímos. Ainda que, em certos aspectos, não tanto
assim. Mas a cada Homem se reserva o justo direito de escolher e cultivar as
suas crenças. Atenção que aqui se sublinha apenas o mais básico dos
desenrolares e suas consequências; pois, se entrássemos no campo da religião
propriamente dita, coesa e institucionalizada, por certo haveria muito mais
assunto para debater. Não se foca, por exemplo, a manipulação registada pela
história ou o controlo pelo medo, tão frequentemente manuseados por quem se
afirmava um “representante dos Deuses”. Mas, retomando o assunto que nos
prendia, sem mais demoras importa referir que olvidámos o princípio da dualidade.
Ou seja, os contrários, ao existirem, sucedem-se, completando um todo. Da mesma
forma em que o Pequeno não existe sem o Grande, ou a Morte sem a Vida, também o
Exterior não subsiste sem o Interior. Porquê, então, procurar na distância
aquilo que sempre residiu em nós, ainda que oculto? Os inimagináveis tesouros
que não poderão ser encontrados no coração que nos habita! Esquecemos que somos
filhos das estrelas; que, em nós, refulge a centelha da Luz Eterna, aquela que
sempre entendemos através de diferentes conceitos, vimos através de díspares
prismas e denominámos por distintos nomes.
Tudo o que nos basta, de momento, encontra-se em nosso redor.
Caso contrário, entrando no fluxo da Vida, o Caminho encarregar-se-ia de nos
guiar até outras paragens. Caminhemos, então – e o vento soprará a nossa
presença. Pois, na verdade, as mudanças ocorrem na consciência que está apta a
recebê-las. Será isso uma questão de crença? Indubitavelmente. E ela somente se
fortificará naquele que conhece e se move pelas linhas que compõem o nosso rumo
– conhecê-las e por elas se mover fornece os motivos de tal crença, obviamente.
Mas o mais secreto dos mistérios está em nós. Descobri-lo e apreendê-lo
significa descobrir e apreender o mais secreto dos mistérios do exterior. Os
extremos interligam-se: um não existe sem o outro e ambos complementam-se. No
entanto, somente quanto cultivarmos o nosso fértil terreno é que saberemos respeitar,
entender e admirar o fértil terreno de terceiros, aqueles que se distendem em
redor do nosso. Se sentirmos a harmonia e plenitude em nós, vê-las-emos
reflectidas em cada gesto diário, em cada cenário contemplado – na união da
Vida e de seus belíssimos componentes. Afinal, quando desperta está a
consciência para uma nova realidade, a antiga, aquela que sempre conhecemos,
transmuta-se por completo, como se irradiasse uma novel luz. E quem, então, não
considerará que algo de divino habita em tão singular momento?
Cada ser, sendo aquilo que é, convergindo com todas as coisas
que o circundam, impulsiona, na Alma de quem os contempla, a certeza de
testemunhar algo de tão primordial e natural, mas, em simultâneo, tão certo,
belo, digno e… sagrado. Assumir a condição que nos é reservada é entender a
natureza que nos compõe. Ou, por outras palavras, abraçar a essência que
sabemos ser (não aquilo que os demais olhares consideram que somos). Por isso,
conquista a tua luz, companheiro de viagem, e por ela chegarás às margens de
uma luz maior – aquela que, desde o início da tua jornada, te espera e te busca
pela imensidão dos mundos. Então, as pequenas partes fundir-se-ão, uma vez
mais, no Todo do qual provêem. E o infinito impregnará de eternidade cada
momento, desprovido de espaço e de tempo.
Pedro Belo Clara.
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