quarta-feira, 27 de julho de 2011

Por um trilho que finda

Quando nos encontramos perto do término de um antigo percurso, pacientemente trilhando as suas últimas milhas, é usual recordar cada uma das coloridas partículas de emoções e de situações vividas: as paisagens contempladas, as dores sentidas e os sorrisos partilhados. Por vezes, com uma ânsia total em rapidamente romper com o que já ficou para trás, tendemos a assumir uma postura intranquila (ainda que celeremente nos apercebamos de tal erro) perante as conclusivas ocorrências. Mas todo o caminho existe para ser trilhado até ao fim, até ao momento em que dá lugar a uma nova direcção ou rumo. Assim, um ansioso agir poderá mesmo traduzir-se num indesejado prolongamento do troço final, um adiamento do desfecho tão esperado. Contudo, se uma antagónica posição for adoptada, certamente que manteremos a mente fiel e concentrada nas últimas curvas daquele trilho, para que a derradeira empresa, em esforço final, não se despiste. E isto sem enumerar as várias belezas que proliferam por um trilho que finda, algo que só quem o percorre, aliviado de seu fardo, consegue entender e sentir.

Poderá ser árduo contender para preservar a suavidade de trato e de acção, especialmente quando os encantos da actividade nos seduzem tentadoramente, mas quem – de entre aqueles que se dizem caminhantes – não sentiu já tais obstáculos? O avanço surge a partir da queda que é analisada e compreendida; a complexidade apenas reforça a firmeza de nossos cajados! Desejamos o grande, é claro, mas será apenas por empreender e cultivar o pequeno que ele será alcançado, sempre com a mesma vontade, crença e dignidade, tal como sucedeu em etapas anteriores. Que tal segredo possa se manter em nós, desperto e pronto a ser utilizado no momento mais propício, até que novos ventos comecem a soprar – eis o que desejo a todos os que despontam pela linha da clarividência.


Pedro Belo Clara.



quarta-feira, 20 de julho de 2011

Consciência de acção

Em determinados momentos, mediante talvez as influências do tempo que se abate sobre cada caminhante, encontramo-nos tão densos e imersos em situações banais e em crises de dúvida (que, no fundo, em nada importam), que nem nos apercebemos do verdadeiro desenrolar dos acontecimentos. Contudo, se perseverarmos e nos mantivermos firmes e fiéis à nossa verdade, cientes daquilo que se desenrola em torno de nós mesmos, tornamo-nos conscientes de cada ocorrência verificada e, em certos casos, até as conseguimos antever.

Em suma, assumimos uma postura de vigia, isto é, tornamo-nos vigilantes, faróis para nós próprios e para os demais, alguém que, de fora, observa e compreende as desenvolturas de um mundo. Isto poderá parecer paradoxal, estranho até, mas, ao assumirmos uma postura passiva, conseguimos obter uma visão e uma leitura mais alargada e imparcial sobre cada uma das questões que nos tocam particularmente. Este desmembramento de envolvência ou, se preferirem, desapego emocional, é sempre árduo de materializar, ainda para mais quando certos aspectos parecem estar ligados à nossa própria Alma. Não se refere aqui a adopção de um racionalismo extremo, nem a abolição da emoção (ambos são necessários, como é obvio; um equilíbrio só se atinge quando os opostos de harmonizam), mas sim uma postura eficaz de acção, uma consciencialização do seu conceito e objectivo. É impossível existir bonança em tempos de tempestade, pelo que estaremos somente a abrir caminho às férteis condições de actuação. A nossa sabedoria interior só assim se conseguirá expressar e, em quietude, se fazer escutar… e será ela a nossa luz, o punhal que dilacerá o negro manto da ignorância. Como se compreende, não me refiro a nenhum desapego, distanciamento, desamor ou negação de auxílio, apenas a uma forma de retiro (breve) para que a solução possa emergir.

Ao atingir e posteriormente manter este nível, despertos e conscientes, conseguiremos obter análises concretas e fidedignas sobre cada assunto, bem como a resposta que mais se adequará a cada acontecimento. Para além disso, fazemos com que nossa visão se erga, deixando os recortes das pedras da estrada para se fixar nos amplos horizontes das paisagens. Quer isto dizer que nos tornamos imunes ao sujo jogo que governa o mundo social que nos envolve, pleno de manipulações, embustes e falsidades. Não mais seremos o subserviente membro do rebanho, mas alguém que reclama por seus direitos e se predispõem a cumprir verdadeiramente os seus deveres. Se uma máquina operar para um fim comum e benéfico, é certo que todas as peças terão o maior prazer em auxiliá-la. Mas descobrir uma consciência e utilizá-la, não sem antes a instruir, é como criar um jardim: cada flor será plantada, à vez, no canteiro certo, até que este fique preenchido. Então, passaremos a plantar num outro, até que fique completo; e assim sucessivamente. No momento mais propício, libertarão, todas elas, o seu perfume para a atmosfera.

Conscientes e serenos conseguiremos reclamar para nós próprios a Verdade e, ao fazê-lo, ajudaremos outros “companheiros de viagem” a encontrar a sua luz (assim como nós encontrámos a nossa) e a assumir um lugar de destaque na demanda pela conquista de um renovado estado de consciência.


Pedro Belo Clara.


quarta-feira, 13 de julho de 2011

Definir e Assumir

É bastante comum (e até propício), quando os dias se apresentam chuvosos, possuirmos uma visão distorcida e deturpada sobre o que se estende diante o nosso olhar. Contudo, se conservarmos a nossa serenidade, confiança, fé ou outras demais virtudes que nos possam caracterizar, iremos observar o irromper de um sol radiante, o revelador da verdade que finalmente se anuncia, trazendo consigo todos os pormenores que, mesmo à nossa frente, permaneciam ocultos pela chuva. Isto, de uma forma geral, não constitui uma ideia ou uma percepção renovada, tendo em conta as nossas anteriores conversas – sempre que se justificou, tal aspecto foi realçado. No fundo, acabou por assumir o papel de um pilar, base de toda a filosofia de caminho que tem vindo a ser explanada.

A verdade, assim, é que após a doação de uma nova visão, o caminhante consegue perscrutar e entender questões que permaneciam inquestionáveis, sentindo-se até, em hipótese, desconcertado com toda a informação retirada de um cenário renovado. Mas notemos o seguinte: o cenário e todos os seus componentes sempre existiram! Apenas estavam ocultos pela chuva que tombava e, não obstante, quem os observa agora possui capacidades que até então permaneciam adormecidas. Será, assim, normal questionar o que sempre considerámos correcto e comum – afinal, ter-se-á operado uma “mudança de percepção”. Mas como operar tal milagre? Materializá-lo realmente, aceder às suas vias de implementação e torná-las reais?

Bem, como nos demais processos, o primeiro passo é interior. Ao olharmos para o nosso mundo, esforçando-nos por o entender e aceitar (revele-se ele como se revelar), estaremos também a perscrutar toda a dúvida remanescente e toda a questão reprimida ou não respondida. E não importa em que áreas elas se acumulam; existem e é importante aplicar as pertinentes artes alquímicas, transmutando-as em certezas e respostas. Pois será assim, ao estimular a anunciação das verdades por eclodir, que tal desejo se implementará em realidade consumada. Com as nossas verdades, definir-nos-emos em Ser, Alma e Corpo, Carácter e Virtude, o produto de um molde firme e digno, recentemente forjado nas fornalhas pela sublime habilidade do Criador que habita em cada um de nós. Ao concretizarmos este espaço, quando a época se revelar próspera, assumir-nos-emos como indivíduos aptos aos desafios futuros, sempre cientes de todos os meios de que dispomos e que deveremos utilizar para que abundantes sejam os momentos de felicidade – o revigorante tónico de toda uma existência.

Em conclusão, permanece a ideia anterior a tudo o que já foi referido e desenvolvido: há que tomar decisões (conscientes ou não) e assumir cada escolha, cada consequência vindoura; aceitar a revelação que emergir significará abrir os braços à Ascensão e às boas venturas que o vento do amanhã soprará em suas douradas promessas.


Pedro Belo Clara.


 

quarta-feira, 6 de julho de 2011

Passividade Necessária

Numa qualquer etapa do longo caminho que a cada dia e a cada instante é trilhado, certamente que impera a noção da importância da passividade, isto é, a espera após o findar de um tempo de acção. Afinal, não podemos regar sempre uma planta; existem momentos em que a devemos deixar seguir o seu natural percurso de crescimento e de fortalecimento.

Quando despertamos e decidimos trilhar as veredas das etapas propostas, assemelhamo-nos a uma árvore frutífera que pacientemente cresce e floresce, até conceber os seus tão esperados frutos. Contudo, após o término do tal período de rega e de crescimento, será necessário aguardar pelo amadurecimento dos ditos frutos. Se agirmos céleres, como seres temerosos e inconstantes (mas quem, de nós, já não se viu nesse papel?), arriscamo-nos a colher os frutos verdes. Se, de facto, eles respeitam um peculiar processo de amadurecimento, não será preferível deixá-los crescer e maturar até que o açúcar neles contido atinja os valores desejáveis? Muito provavelmente, todo o esforço por nosso ânimo empreendido será digno dessa paciência. É claro que, até lá, inúmeras circunstâncias e situações despontarão, requerendo uma resposta ou decisão, mas, enquanto aguardarmos a suprema resolução (isto é, o maturar dos frutos, nossos empreendimentos), deveremos manter nossa atenção (ou percepção) desperta e apta a resolver qualquer questão que se formule. Não será isto um mero conselho meu, alguém que fala de entre vós, como vós e para vós, mas somente um válido caminho de actuação. Em todo o caso, como é sabido, todo o caminhante se guiará pelas indicações de sua bússola interior.

Em suma, sabemos que possuímos sempre o método que será a resolução da dúvida; o obstáculo, em muitos casos, reside na dificuldade em identificá-lo. Aparentará ser contraditório aceitar uma espera, quando o que mais se anseia é agir, plantar e fazer crescer nossas ideias e realizações, mas o Caminho possui os seus tempos próprios, as suas estações. A serenidade preservada e a confiança no porvir, por mais indefinido que este possa ser, são, uma vez mais, os pilares que se afiguram mais sólidos. Aceitá-los é um desafio; qual de vós, intrépidos caminhantes, se atreverá a agarrar uma tal certeza?


Pedro Belo Clara.